terça-feira, 5 de julho de 2011

Tudo o que sobe...


Um dia desce, já dizia um velho clichê. Aliás, vou começar falando de um outro clichê. Sempre que um evento importante de MMA está para começar os jornalistas de sites especializados já começam a tentar predizer os resultados das próximas lutas. Quem acompanha já sabe: Fulano impõe um jogo em pé muito bom, mas no chão ele não é tão afiado, já Cicrano, notório faixa-preta de Jiu Jitsu, tem demonstrado evolução nos seus ataques e tentativas de anular strikers, e deve ganhar por decisão unânime, etc, etc. Eu admiro quem tenha um olhar mais treinado para poder fazer esse tipo de afirmação, eu gosto de ler essa predições, me sinto um pouco como um menino que quer saber o que aguarda a próxima temporada do seu programa de TV favorito, fora que deve servir de referências para quem curte apostas. Contudo, mesmo sendo ainda um marujo de primeiras viagens nessas análises de luta, percebi uma coisa: essas predições não querem dizer muita coisa. Por mais que muitos deles acompanhem com afinco os combates e possam até possuir conhecimentos práticos de luta, afirmar quem vai ou não vencer um combate é quase tão arrogante quanto predizer um acidente. Pelo menos foi assim com as lutas que aconteceram neste sábado no UFC 132 – Cruz Vs Faber, em especial a de dois veteranos do esporte.

Vejamos, primeiramente, Tito Ortiz: o sujeito era um dos maiores diabos no UFC no final dos anos 90 até o começo dos anos 2000. O Bad Boy de Huntington Beach, com sua bandeira de “dupla nacionalidade”, contendo de um lado o México e do outro os Estados Unidos da América, fincou uma série de vitórias incontestes ao longo de sua carreira. Com seu cabelo tingido de loiro e uma impetuosidade de fazer inveja ao Maradona, Ortiz se tornou um sujeito tanto amado quanto odiado dentro do esporte. Sem sombra de dúvidas que o hype em torno dele era justificado: ao longo de sua carreira ele colheu vitórias em cima de nomes duríssimos, como Ken Shamrock, Vladimir Matyushenko, Vitor Belfort e Evan Tanner.

Contudo, desde sua vitória devastadora sobre o já citado Shamrock em 2006, Ortiz não ganhava uma luta. Embora a maior parte de suas derrotas tenha sido contra oponentes de alto calibre, tendo apenas a derrota contra o esforçado Matt Hamill como ponto mais baixo, a coisa estava ficando feia para o ex-campeão. Por menos que isso Chuck Liddell foi aconselhado a aposentar por Dana White, o que levou até mesmo a boca pequena dizer que o presidente do UFC mantinha o lutador em seu card como punição pelos anos de desavenças e polêmicas entre ele e Ortiz. Chega a ser tristemente irônico que o mesmo lutador que defendeu por cinco vezes o cinturão dos meio-pesados ficasse quase cinco anos sem ganhar um combate.

Sua luta contra Ryan Bader, oponente mais jovem, que havia tido até aquele momento sua única derrota contra o astro Jon “Bones” Jones, era vista com ceticismo pela mídia especializada. Embora respeitosos com seu legado, as predições eram claras, vitória para Bader. Mas não sei se por estar escrito nas estrelas, se por devoção a Nossa Senhora de Guadalupe ou simplesmente por estar mais velho, porém não morto, ele fez o que poucos analistas pensariam que ele seria capaz de fazer: derrubar o ligeiramente hypado oponente com um gancho de direita e finalizá-lo com uma guilhotina mais justa do que as roupas das meninas das placas. Quebrou seu jejum de quatro anos sem vencer e ainda por cima ganhou o prêmio de finalização da noite. Naquela noite não ficou claro se ele está de volta, se ainda veremos Ortiz castigar seus adversários com a mesma truculência de dez anos atrás. Mas quem é que vai dizer na cara dele que “o melhor já passou”?
O árbitro Mario Yamazaki ergue os braços do vencedor Tito Ortiz

Enquanto a noite do marido de Jenna Jameson foi de alegria, a dos brasileiros foi amarga. A penúltima luta do card era o aguardado retorno de Wanderlei Silva depois de um ano sem lutar. Se você chegou agora no meu blog, caso tenha começado a acompanhar as artes marciais mistas há pouco tempo, vai uma breve história: Silva, curitibano, começou a lutar profissionalmente depois de servir ao exército, impressionando a todos com um estilo de luta agressivo, calcado em seu fortíssimo Muay Thai, afiado na academia Chute Boxe, que revelou nomes como Mauricío Shogun (grande amigo do Wand), Murilo Ninja e os fenômenos Anderson Silva e Cristiane “Cyborg” dos Santos.

O “Cachorro Louco”, alcunha pela qual ficou conhecido, deixou sua marca no esporte pela agressividade e por um cartel marcado por numerosos nocautes. Depois de fazer seu nome nos campeonatos nacionais, Wand lutou algumas vezes no UFC, mas sua trajetória na liga não foi tão brilhante. Foi inclusive nocauteado por Vitor Belfort em 98, no primeiro UFC realizado no Brasil, em meros 44 segundos. Não que fosse vergonha ser derrotado pelo Belfort naquela época, mas aquele ainda não era o palco para o Wanderlei exercer a sua mágica. Não, não, meus senhores, esse momento foi no dia 27 de agosto de 2000, no Japão, numa luta contra Guy Mezger, na décima edição do Pride. A partir desse nocaute Wanderlei iniciaria uma das campanhas mais demolidoras da história do evento. Por seis anos esse homem defendeu o seu cinturão de pesos médios, além de ter tentado sua sorte em categorias mais pesadas, e derrotou figuras como o lendário, Kazushi Sakuraba, o “caçador de gracies” japonês, Quinton “Rampage” Jackson e Dan Henderson. Ganhou inclusive um apelido em inglês que o vestia muito bem: The Axe Murderer (algo como, “O Matador do Machado”). Em suma, o homem é uma lenda do esporte, uma das figuras mais carismáticas e impressionantes a subir em um ringue ou entrar em um octógono.
Um exemplo do que acontecia com quem enfrentava o Wanderlei no Pride
 Mas não tem jeito, o que sobe desce mesmo. Saindo de duas derrotas em suas últimas lutas no atualmente extinto Pride, Wand começou no UFC em dezembro de 2007 perdendo para Chuck Liddel, embora ganhando bônus pela luta da noite. Depois dessa acre retorno ao Ultimate, o campeão derrotou Keith Jardine, conseguindo o nocaute da noite. Mas depois dessa vitória, o que se sucederam foram amargas derrotas: Rampage Jackson conseguiu sua revanche após sofrer dois nocautes na época do Pride, e foi também derrotado pelo ex-campeão Rich Franklin, embora, mais uma vez, tenha provido a luta da noite.

Cachorro Louco, que entrou na liga lutando na categoria dos meio-pesados, decidiu voltar aos pesos médios, numa justa tentativa de recuperar o seu ritmo. Estreou com vitória sobre o inglês Michael Bisping, no ano passado, num ritmo de luta menos frenético, porém eficiente, mas devido a uma série de lesões o lutador teve que ficar um bom tempo de molho. Seu retorno se daria contra Chris Leben, lutador revelação do primeiro The Ultimate Fighter, conhecido por lutar de maneira muito similar a Wanderlei e por ter um dos queixos mais elogiados do MMA. Leben, assumidamente fã de Wanderlei, desde o início se mostrou agradecido e temeroso em enfrentar seu “herói”, afirmando em recentes entrevistas que utilizava o seu medo para impulsionar seus treinos para a luta do dia 2 de julho.  Wand, embora envaidecido, dava seu recado de que no octógono não haveria essa de “fã”, e que iria derrotar Leben, num nocaute como aqueles que cavou em seus anos dourados. As predições eram claras: se Wanderlei mostrasse o jogo maduro que apresentou contra Bisping, a vitória era dura, mesmo que Leben usasse seu estilo “brawler”, ainda assim Wanderlei, o homem que aperfeiçoou essa arte, seria ganhador.

Entretanto, após vinte e sete segundos do primeiro round do embate, o mundo inteiro assistiu ao formidável enterro de sua última quimera: Wanderlei é nocauteado. O “discípulo” superou seu “mestre”. Assistir aquela luta foi como ver um caminhão bater contra uma grande rocha. Ninguém esperava por aquilo, provavelmente nem mesmo aqueles que acreditavam na vitória de Leben, mas aconteceu. Pior ainda, aconteceu na noite anterior ao aniversário de 35 anos.
A cena que nenhum brasileiro queria ver
Não se pode saber se Ortiz vai conseguir novamente uma chance para o cinturão, como disse querer após sua surpreendente vitória. Dana White mostrou publicamente seu apoio para que Wanderlei se aposente, embora o mesmo pareça mais interessado em tentar provar da glória novamente. Minha cabeça acredita que talvez Wanderlei tenha mesmo que sair dessa vida, se dedicar a sua academia, quem sabe lapidar o futuro campeão absoluto de sua categoria. Mas do fundo de meu coração espero rever Wanderlei mostrando novamente o porquê de ser uma das figuras mais admiradas do esporte, mesmo que apenas por mais uma vez. Não por ele ter algo pra provar, mas sim para demonstrar que seu “machado” continua “afiado”. O que ele decidir eu aceitarei. Aliás, aceitaremos. Seremos eu e mais uma legião de velhos admiradores.



2 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns Luiz, ficou muuito boa a matéria.

Luiz Alexandre disse...

Valeu, Otávio!