Cheick Guillaume Ouedraogo é um lutador de MMA, nascido no dia 17 de maio de 1975, em Paris, na França. Filho de uma Burkinesa com um Congolense, Cheick começou a praticar artes marciais ainda menino, com 5 anos, no Kendo e no Karate. Com o passar dos anos o jovem Cheick se dedicaria a uma série de outras modalidades marciais, como o Muay Thai, Savate, luta Greco-romana e mesmo o Silat Indonésio. Após se profissionalizar em 2001, com a alcunha de Cheik Kongo, numa provável homenagem a terra natal de seu pai, a França teria seu primeiro grande embaixador do MMA, algo que Sarkozy provavelmente prefere ignorar.
Mas a verdade é que Kongo, apesar de um cartel admirável de 16-6-2 no MMA já não vinha mais chamando tanto atenção. Seu nome não se encontra no nem perto do topo do ranking de pesos-pesados do esporte e já não derrota um adversário de peso desde 2007, quando venceu por decisão unânime Mirko “Cro Cop” Filipovic. Depois disso, veio com um rendimento relativamente sólido, tendo inclusive uma oportunidade de disputar o título dos pesados, mas que foi tomada de suas mãos pelo feroz Cain Velásquez. Apesar de ser até o momento o único adversário que levou o invicto mexicano para a decisão, um feito que deveria ter sido comemorado com uma medalha, ser o derrotado no MMA, principalmente numa liga tão importante quanto o Ultimate, infelizmente não passa da não obtenção de uma vitória.
Talvez por ser um lutador agressivo, cujos golpes possuem alto poder de nocaute, Kongo conseguiu se manter no UFC mesmo computando 4 derrotas e um empate dentro, da liga saldo negativo muito mais alto do que o normal dentro da liga. Entretanto, sua fama ainda o galgou como segunda luta principal contra Pat Barry em um evento que prometia muito: UFC On Versus 4, a estréia do lutador Nate Marquardt na categoria meio-médio contra Anthony Johnson. Contudo, o oponente de Marquardt teve de se afastar da luta por lesão, sendo substituído faltando pouco mais de duas semanas por Rick Story, jovem lutador que vem fazendo uma bem sucedida trilha dentro do UFC. Mesmo tendo lutado há pouco mais de um mês contra o brasileiro Thiago “Pitbull” Alves, Story resolveu mostrar serviço e topou o desafio, provavelmente na esperança de disputar o cinturão contra o astro canadense Georges St. Pierre.
Quem foi que disse a vida é fácil? Em pouco mais de 24 horas antes da luta, Marquardt era retirado da disputa e do UFC por motivos, até aquele momento desconhecidos. Na verdade o card do evento já mostrava complicações com lesões e substituições sendo feitas a todo o momento. Na última hora não teve jeito, Dana White, o presidente, colocou Kongo contra Barry se enfrentando no card principal. Foi a primeira vez que o parisiense fez a última e mais aguardada luta em um evento do Ultimate.
Evento principal por acidente |
Chega o dia 26 de junho. Depois de tantas controvérsias muitos já esperavam o pior, mas no final tudo deu certo. Lutas como o movimentado (e polêmico) embate entre Charles “Do Bronx” Oliveira contra Nick Lenz e Matt Mitrione contra Christian Morecraft fizeram a alegria dos fãs do esporte. Na mesma noite presenciaram o “duelo de azarões”, onde Charlie Brenneman, substituindo Marquardt, conseguiu sobrepujar Rick Story e ainda conquistar a simpatia dos espectadores.
Até aí Dana White já devia de estar satisfeito em perceber que a noite tinha dado certo, só faltava o último combate, entre Kongo e Barry, ambos conhecidos pelos golpes violentos. Kongo já despontava como favorito, pois além dos golpes, possui o chão mais afiado, mas sempre tinha o perigo dele tentar levar o duelo pro chão e amarrar o combate. Os dois lutadores subiram no octógono. Se encararam, mas não tocaram as luvas. “Em suas posições”, disse o árbitro. Ele faz o sinal e os lutadores começam. Tentativa de Barry em levar a luta ao chão, low kicks de Kongo, a luta fica em pé. Em pouco mais de dois minutos, depois de trocarem alguns golpes, Barry encaixa um cruzado de direita em Kongo. O lutador cai. Barry vai imediatamente em direção do lutador, que grogue tenta arrumar uma maneira de escapar das mãos de pedra do seu adversário, que o castiga sem parar. Quando tenta ficar de pé, catapimba, outro soco de Pat. Nessa altura o público pensa: “já acabou, separe os lutadores juiz”. Naquele momento assistíamos a uma covardia, um dos piores excessos no MMA, quando um lutador visivelmente afetado por um golpe continua a ser massacrado pelo seu oponente. Não havia viva alma no Rogers Sportsnet, no Canadá, que acreditasse na continuidade do combate.
Kongo devia acreditar. Como se fosse a própria Fênix, finalmente de pé, após praticamente escapar da morte, tentando se manter próximo ao corpo do oponente, o parisiense acerta um cruzado de direita no rosto de Barry em, em seguida, um gancho, com a mesma mão. Barry cai. Contrariando Nelson Rodrigues o videotape, naquele instante, não mentiu. Pudemos ver os olhos de Barry rolarem e o opulento lutador caído, quase inconsciente. Há até mesmo astrônomos da NASA que digam ter visto sua alma posando na Lua, perto da bandeira de Neil Armstrong. Kongo renasceu naquela luta. Mais do que seu retorno – ou talvez sua verdadeira aparição – os espectadores do evento presenciaram uma das melhores viradas da história do MMA, um momento verdadeiramente sublime em meio ao caos, as luzes, o sangue e o suor da Arena.
Pode ter sido golpe de sorte, pode ser que Kongo se torne a partir dali o lutador que nunca havia conseguido ser antes. Não importa. Um francês, filho de imigrantes africanos, conseguiu seu lugar na história de um esporte ainda novo, vítima de muitos preconceitos. Preconceitos que o próprio deve ter encarado como um negro num país de maioria branca. Não foi o queixo de Barry que Cheick Guillaume Ouedraogo atingiu com aquele gancho. Foi a descrença em seu potencial, a dúvida sobre seu valor como lutador. Dana White provavelmente ficará de olho nele. O mundo também.
5 comentários:
Porra, que texto!!! Poético!!! Se o Congo não fosse tão marrento, eu derramaria uma lágrima lendo os parágrafos finais.
Obrigado, Herax!
Lindo texto mesmo!
Muito orgulho do meu namorado (para deixá-lo um pouquinho envergonhado)!
;)
E adorei o "catapimba" no 6º parágrafo!
:D
I stand...
clap,clap,clap!!
Valeu, broder!
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